sábado, 17 de abril de 2010

Musicalidade - Por: Anibal Cenzi

Há músicas que não deveriam ter fim. Sua confluência de harmonias trazem à mente inumeráveis experiências. A música em sua forma mais profunda nos embui de sinestesias tão insólitas e deslumbrantes que nos fazem buscar algo de muito imenso em nós mesmos, ou algo de infinito, por vezes jamais experienciados e vivido no cotidiano. As notas musicais e seus efeitos sonoros quando nos tocam à sensibilidade, quando desperta em nosso âmago um intenso desejo de só estarmos ali, parados, imersos nas melodias, adentrando em nós mesmos e conduzindo emoções de um denso prazer que revela em si a essência da vida. A vida que se manifesta como tudo que é terno, tenro, ou ainda que nos põe em situações em que o ódio e o amor são sinônimos; prazer e sofrimento estão em sinestesia e resultam em desejos de revolução; belo e feio compondo uma simetria tão parecida com as nuaces sonoras que nos carregam a uma sensação de agradabilidade distinta, fundindo idéias antagônicas, sentimentos e emoções conflitantes. Enfim, uma síntese do inconcebível, do inexorável, apenas apetecível, apenas reflexo de infinitos desejos e vontades governados pelo mais singelo prazer de viver com aventura e sem tédio.

A música também dá à emoção a experiência do desespero. Do desespero de viver intensamente tudo o que se apetece, como se a morte chegasse logo no instante seguinte. Do desespero que cria a revolta e que é capaz de fazer emergir a revolução mais radical. Seja para transformar uma realidade que nos impossibilita de viver ou para transubstanciar qualquer preconceito ou limitação existente em nós que nos restringe, reprimindo-nos, qualquer situação em que a plenitude da vida e de suas emoções estejam cercadas, oprimidas, não dando à vida aquilo que lhe é de direito: a liberdade infinita dos prazeres, da satisfação dos desejos e do dever de construir uma realidade diferente, mesmo que vinda do caos, uma existência vinda da infância, vinda da anarquia: sua condição natural de ser.

Também importante frisar é a emoção do choro que emerge das sonoridades harmônicas e belas, ou mesmo desarmônicas e ruidosas. Choro que não emerge por eventualidade, mas semelhante a um grito, um brado que precisa arrombar as portas fechadas de uma existência chei de tédio e desespero. Choro este que manifesta um fluido de tudo que está latente no ser: amor, ódio, tristeza, alegria, revolta, paz, destruição e edificação das esperanças mais remotas. Esperanças peuris. Choro carregado, denso e cheio de essências que almejam alcançar reciprocidade nas relações humanas, nas relações entre amantes. Na verdade uma eclosão amorosa que constantemente quer sentir nos abraços que acabaram de se encontrar a experiência de viver sem reservas um para o outro e para as infinidades do mundo. Quem sabe mesmo um universo mergulhado e criado a dois. Sonhos que buscam no passado um sentido de alegrias que nos tirem risos felizes e no presente toda candura possível.

Sonhos que buscam no passado sorrisos alegres e acalentadores para suprimir as infinitudes e emoções não satisfeitas (realizadas), que libertem as angústias acorrentadas na consciência do tempo que passou e que só temos domínio em pequenas dimensões ou na sublevação alcançada quando buscamos pelo tempo perdido. Sonhos que resgatam no presente a amplitude da vida e não o arrependimento; sonhos salvadores dos envolvimentos não contente com algo que no mínimo seja perfeito e pleno.

Sonhos que buscam no passado não nos suicidarmos nos próprios erros, nos arrependimentos, nas insatisfações frustrantes, carregadas de vazio. Preencher a vida com esperanças libertadoras que não custem a dor de estarmos imerso em incertezas.


(como explicado no titulo, texto de um grande amigo, espero que consigam absorver a real essência do mesmo)